terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O Marido Humilhado: Histórias Inéditas da Vida Como Ela É, Nelson Rodrigues

Ficha Técnica

Gênero: Contos
Ano de lançamento: 2008 (?)
Ano desta edição: 2008
Editora: Agir Editora / Selo Pocket Ouro
Páginas: 176
Idioma: Português

Citação: "- 'Então, como é isso? Você continua com esse namoro? Fala! Continua?'
A menina começou, já fazendo beicinho:
- Papai! Eu gosto dele, papai! Gosto!
Não se descreve o horror do velho: - 'Ele te bate e tu gostas dele!' Estendia para a filha as duas mãos calejadas:
- Te deu na cara, minha filha, e a cara é sagrada!
Malvinha soluçava: - 'Gosto! Gosto!' Dr. Euvaldo já não entendia mais nada. A filha sai. Volta-se para a mulher que, estupefata, assistia à cena: - Minha filha saiu a quem? A mim, não foi, que eu não gosto de apanhar! E se não foi a mim, foi a ti! Responde! Foi a ti que ela saiu? Gostas de apanhar? Gostas?"


Em 2012 completaram-se 100 anos do nascimento de Nelson Rodrigues. Muitas exposições e homenagens foram feitas a um autor polêmico, seja em seus contos, suas peças de teatro, e até mesmo quando comentando futebol (uma de suas grandes paixões). Para a TV foram também muitas adaptações, sendo talvez a mais famosa a adaptação de seus contos na série "A Vida Como Ela É", exibido nos anos 90 como um quadro do Fantástico, e que teve alguns episódios re-exibidos também ano passado:


Entre 1951 e 1961 mante no jornal Última Hora a coluna "A Vida Como Ela É", que rendeu um livro do mesmo nome, e que ainda dispunha de material para outros livros, caso deste "O Marido Humilhado".

Para quem assistiu a série da Globo (se não, procure no youtube), a temática do livro é a mesma: relacionamentos adúlteros, paixões obsessivas, ciúmes incontroláveis. Junte-se a estes temas básicos a capacidade absurda para criar tipos incomuns de Nelson Rodrigues, e terá um prato cheio: a garota fria, que só se excita com beijos na orelha esquerda; a menina de 17 anos, obcecada com um homem mais velho e que, desprezada, aproxima-se da filha dele, que tem sua idade; o casal que se excita ao proferirem xingamentos contra o noivo da mulher infiel; o menino, criado pela prima 17 anos mais velha, que vai se apaixonando perdidamente por ela enquanto cresce; a garota que cobiça o noivo da irmã mais velha, pois acredita que esta o roubou dela; o rapaz de família tradicional que se apaixona por uma garota do subúrbio, e causa protesto de seus pais; o marido que ouve que sua mulher o trai, mas que quer ouvir a final da copa de 58 antes de decidir o que fazer; um genro e sua sogra, inimia mortal; e por aí vai. São 20 contos, todos curtinhos, pois eram publicados no jornal, o que dá um padrão de desenvolvimento a todos, e também uma concisão que culmina com Nelson Rodrigues deixando para as últimas linhas (últimas mesmo!) a conclusão do conto, muitas vezes com uma desfecho inesperado e chocante.

Os contos trazem uma imagem de um Rio de Janeiro bucólico, e muito charmoso, retratando famílias tradicionais da classe média, pessoas do subúrbio, uma outra época, e com outros costumes também. Ao ler o livro até parece que todo mundo dava seus pulinhos de cerca, tão comuns são os relatos de traição. E sem contar que Maria da Penha iria passar um mal bocado no Rio de Janeiro de Nelson Rodrigues, onde dar uns bofetes na mulher não só era prática comum, como prova de amor, e altamente recomendado ("Deu uma surra na mulher? Está curado, minha senhora, está curado! Meus parabéns!").

Ao final da leitura, fica claro que há um tema comum a todos os contos do livro, e ele está bem exposto no título: a humilhação a que as pessoas são expostas, ou a que se sentem expostas. E que este tema levará, quase sempre, há um outro, muito mais radical: a vingança, muitas vezes cruel e dolorosa, em alguns casos simplesmente prazerosa. No final das contas, "A Vida Como Ela É" nunca é aquilo que gostaríamos que fosse.

Nenhum comentário:

Postar um comentário