sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Continhos Galantes, Dalton Trevisan

Ficha Técnica

Gênero: Contos
Ano de lançamento: 2003
Ano desta edição: 2010
Editora: L&PM Editora
Páginas: 104
Idioma: Português

Citação: "- Agora de pé.
- Será?
- Aperte as pernas. Mexa. Suspire. Grite.
- Não sei.
- Não sabe dançar? Então dance. Sem sair do lugar.
Salve lindo pendão da esperança, salve, salve.
- Veja, estou tremendo. Será de...? Tão diferente.
Testinha úmida, revirava o branco do olho, o pescoço ondulante de cisne, a língua rolando no céu da boca.
- Desculpe a unhada.
Na hora nem sentiu, depois saiu sangue.
- O que você fez, querido? Ai, amor...
Vingado, eu, que nunca podia dançar com a moça mais alta. O baixinho de todas as paixões e nenhuma correspondida. Pardal nanico, por todas as tijiticas perseguido.
- Veja o que me fez. Minha mão, olhe, ainda treme. Ai, amorzinho.
Brilho no céu em raios fúlgidos o brado mais retumbante que ouviram do Ipiranga as margens plácidas."


Dalton Trevisan, o Vampiro de Curitiba, selecionou ele mesmo os contos que fazem parte desta coletânea. E, olha, selecionou muito bem. O livro é recheado de luxúria e sedução em 14 ótimos contos de um autor considerado mestre neste tipo de narrativa.

O livro começa com "Na pontinha da orelha", onde Nelsinho, o próprio vampiro de Curitiba, em uma aventura de sua adolescência, visitando Neusa, tenta ludibriar a vó e guardiã da moçoila ("Mudá-la para o sótão. Acaba rolando da escada") para poder trocar o óleo.

Em "O Roupão", uma esposa adúltera e um amante desconfiado num encontro furtivo, com talvez alguém na platéia... O interessante de Trevisan é construir, em menos de 10 páginas, personagens complexos, com histórias, medos e frustrações, pequenos desvios de caráter, seus desejos e esperanças.

Em "Cafezinho com sonho", um chefe dando em cima de sua funcionária durante o expediente (não é assédio se for de comum acordo, creio eu). Trevisan mistura o pouco que há de narração neste conto (são praticamente só diálogos), com as impressões do doutor Osíris ("um tanto afogueada, arzinho desafiante de riso - essa já perdeu o respeito"), não se preocupando com formalismos; o resultado sempre é gostoso de ler, como as investidas em dona Laura.

"Os mil olhos do cego" já foi comentado aqui, e trata de dois amigos que se reencontram, um deles bem disposto a "apimentar" a relação dos dois.

Em praticamente todos os contos do livro, um pouco de sedução, perversão ou luxúria: em "O Matador", um homem se encontra com sua amada, "99 quilos de carne branca", para uma noite de libertinagem. Em "Peruca loira e botinha preta", um casal de amantes une-se para um último encontro furtivo: ela, somente com um casado a cobrir seu corpo nu, para satisfazer seu amado, mas morrendo de medo do marido; ele, pronto a fazer tudo que não pode em casa ("Quer mais, sua cadela? O quê? Senhora honesta? Não me faça rir"); quando se encontram novamente, a conclusão é simplesmente genial.

Um marido boêmio, um velhinho safado em confidências com seu médico ("As mais crescidas sabem tudo. Menina... a gente que ensina"), confissões de donas de casa atrevidas ("Foi lá uma tarde consertar o balcão. Eu passava pela sala, sentia o olho atrás de mim. Mulher sabe, ela adivinha. Não foi dita uma palavra. Voltei da cozinha, olhei aquele braço mais peludo. Me deu uma coisa. [...] A cama estava perto, só fechamos a porta"), um conserto de chuveiro que aproxima dois velhinhos ("Vou com tudo, ela recebe num longo suspiro. Entro com firmeza. Aí geme e pede pra morrer. [...] Quer mais? Castigo sem dó. Que se farte, a avozinha"), um advogado safado e uma cliente manhosa ("No meio das pernas um botão chamado cli-tó-ris. Ali é que meu dedinho ia bulir"). Os feromônios exalam das páginas, e Trevisan não deixa ninguém de fora de sua orgia literária.

Sem nunca deixar uma leve ironia pairando ao fim de cada conto, Trevisan não é óbvio, nem vulgar, não prega falsos moralismos, e excita a imaginação de quem gosta de boa literatura.

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