domingo, 13 de maio de 2012

A Estrada, Cormac McCarthy

Ficha Técnica

Título original: The Road
Gênero: Romance
Ano de lançamento: 2006
Ano desta edição: 2010
Editora: Alfaguara
Páginas: 234
Idioma: Português (tradução de Adriana Lisboa)

Citação: "Pegou a mão do menino e colocou o revólver nela. Pegue, ele sussurrou. Pegue. O menino estava aterrorizado. Colocou o braço em volta dele e o abraçou. O corpo tão magro. Não tenha medo, ele disse. Se eles te acharem você vai ter que fazer isto. Está entendendo? Shh. Não chore. Está me ouvindo? Você sabe como fazer. Coloca dentro da boca e aponta para cima. Faça rápido e com força. Está entendendo?"


"A Estrada", de Cormac McCarthy, foi uma surpresa para mim. Não conhecia o autor, não sabia do filme, não tinha ideia sobre o que seria o livro além do que estava escrito na sua contracapa quando ele chegou em casa, presente de uma grande amiga (obrigado, Mari!).

O "Vencedor do Pulitzer" no alto chama a atenção. E o livro não decepciona. Ele conta a história de um pai e um filho (que não têm seus nomes revelados), que após um evento apocalíptico tem de viver em um mundo em ruínas, lutando pela sobrevivência. Eles vagam pelas estradas destruídas, tentando chegar à costa, sem saber o que encontrarão.

O narrador é em terceira pessoa, mas não é onisciente, e sim parcial: ele acompanha a figura do pai, e registra tudo pelos seus olhos. McCarthy utiliza-se muito do ambiente que os cerca para descrever os sentimentos do pai, não usando o recurso de revelar seus pensamentos diretamente: num mundo arruinado, com o ar coberto de cinzas e com chuvas e frio constantes, o humor e expectativas do pai refletem o ambiente, o que é bastante interessante ("Ele ficou deitado ouvindo a água gotejar no bosque. Um leito de pedra, isto. O frio e o silêncio. As cinzas do mundo falecido carregadas pelos ventos frios e profanos para um lado e para o outro no vazio. [...] Todas as coisas retiradas de seu suporte. [...] Sustentadas por uma respiração, trêmulas e breves").

Um ponto interessante é que o livro começa de um determinado ponto de sua jornada, sem uma introdução. Aos poucos, o panorama é apresentado e passamos a entender um pouco a situação dos protagonistas. Nesse aspecto o "resumo" da contracapa é ruim, pois ele quebra todo o clima criado por McCarthy no começo do livro, revelando aos poucos a situação em que eles se encontram (se bem que o ponto chave do livro, esse sim é guardado para mais tarde; e que choque!). Mesmo assim, o evento que causou a destruição da humanidade não é explicado, nem quando ocorreu: o homem apenas diz que foi "há anos atrás". Isso faz todo sentido, afinal o narrador acompanha o pai, e ele não é detentor de toda a informação. E também somos poupados de toda aquela tentativa de justificar cientificamente um possível evento apocalíptico, que já estamos cansados de saber de outros filmes.

O livro é arrastado. Na maior parte do tempo, pai e filho vagueiam pela estrada, e sua rotina e pequenas conversas são esmiuçadas. É de se admirar que McCarthy consiga fazer uma obra de algo que, se formos pensar, é extremamente enfadonho. Mas ele escreve bem, utiliza-se de expressões diferentes para descrever o ambiente ao redor, e consegue dar cara nova para o que, aos olhos de pessoas menos talentosas, seriam apenas árvores carbonizadas. Mas também há os momentos de tensão, que geralmente ocorrem quando eles encontram outras pessoas pela estrada. São eventos rápidos e intensos, descritos de maneira tão fugaz que, quando você percebe, a ação já ocorreu. Como na vida, quando dizemos que "foi tudo tão rápido, quando eu vi já não dava mais para reagir". E o que é revelado, logo no primeiro encontro, me deixou de cabelo em pé. E aí é que a grande questão do livro se revela: o que é a humanidade, afinal? Somos definidos pela sociedade em que nos encontramos, ou pelo que queremos ser e como queremos agir? O que é certo e errado afinal? Se ética é um conjunto de leis determinado por uma sociedade sobre a maneira como as pessoas devem agir, quando tal sociedade deixa de existir tais regras ainda se aplicam? Na luta pela sobrevivência, vale mesmo a lei do mais forte? Aliás, vale a pena sobreviver em um mundo cujo futuro é sombrio?

Obviamente o livro não te dará as respostas para tais perguntas, mas fará você refletir sobre elas, e se perguntar "o que eu faria em uma situação assim?". Para quem gostou de "Ensaio sobre a Cegueira", de Saramago, e gosta de "The Walking Dead", o livro aborda temáticas parecidas e pode ser uma boa pedida. E talvez te faça pensar sobre as coisas importantes da vida, e sobre viver e sobreviver.